sábado, 24 de dezembro de 2011

"UMA VISÃO ATLÂNTICA": POESIAS DA MINHA AUTORIA


CRIANÇAS DE CABO VERDE

“Não foi o público de poesia que desapareceu, como querem alguns teóricos da literatura. O que desapareceu foi a poesia em contato com a vida das pessoas. Talvez ela esteja adormecida, esperando que alguém traga de volta o simples prazer de ler um poema.”

Fabrício Carpinejar jornalista e poeta, autor de “Terceira Sede” e

“Um Terno de Pássaros ao Sul”

ENSEADA DA CIDADE DO MINDELO, ILHA DE SÃO VICENTE, CABO VERDE

É PRECISO ACREDITAR (II)

Ah grande José, meu ancestral tecelão e sáfaro!

As caravelas trouxeram-te pra cá.

Depois seguiste viagem…

Brasil, Antilhas, Cuba, Jamaica, Bahamas e mais e mais.

Nas enseadas da Ribeira Grande e Praia Maria, navios.

Chegaram as naus para uma proto-global negócios.

Em grande conluio fizeram-se sócios.

Ah minha civilização caboverdiana!

Do grande José, do Zezinho, da Lisa, da Aracy e da Mamazinha.

Do gigante Santiago, ilha berço de todos nós.

Paralelo vinte e três, civilização tropical.

Também entendo porque sou afro-brasuca.

Ouvi dizer que até as nossas vacas foram pastar à Baia de São Salvador.

Da terra do pau-brasil também vieram encomendas.

Milho e mandioca pra cachupada à D.Nhánha.

Pra lá levaram o bom José africano.

(…) Dramas e traumas no meu país.

Mas é preciso acreditar,

Sim é preciso acreditar que vamos vencer.

(…) É, nossos olhos voltaram pra «terra longe».

Á Lusitânia fomos preencher a debandada para a Europa abastada.

Nas baleeiras fomos na rota de Colombo.

Também fomos pras tulipas holandesas.

Mas é preciso acreditar que vamos vencer.

Valha-nos Deus… Mas é preciso perdoar.

(ABRIL de 2003)

FAROL MARIA PIA NA ENSEADA DA CIDADE DA PRAIA, ILHA DE SANTIAGO, CABO VERDE

É PRECISO ACREDITAR (III)

Sim, os nossos olhos voltaram pra "terra longe".

Cetáceos de cá da terra foram conosco.

Labutamos em Cape Code.

Trabalhamos em Fall River.

E lá se fez uma grande diáspora crioula.

(…) Vamos acreditar.

Sim é preciso acreditar que podemos vencer.

Na aventura até mesmo corremos atrás do ouro.

Até mesmo nos comboios do pacífico.

Também a bordo nos países baixos.

Na guerra dos outros, meu jovem ilhéu chegou à Guiné-Bissau.

E meu povo espalhou-se pelo mundo.

Vamos acreditar.

Sim, é preciso acreditar… que vamos vencer.

Houve uma vaga em Lisboa,

Lá se foi nosso Zé – pedreiro pra construção civil.

Houve uma chance em Roma,

Lá se foi nossa Mamazinha terra-terra cuidar da italianazinha.

E assim meu povo foi pra o outro lado do mar.

Vamos acreditar que vamos vencer,

Que vamos vencer, valha-nos Deus.

Por um decreto, um navio rumou a Sul.

E lá se foi a nossa gente outra vez.

Lá se foi meu povo serviçal pras roças de São Tomé

«Demos o nome» ao contratador mor… Mas vamos perdoar.

«Santamos a praça» em desespero de causa… Mas vamos perdoar.

E assim meu povo foi pro exílio.

Um «pé-de-meia roto» foi a paga…

Mas precisamos perdoar.

(…) É preciso acreditar...

Sim é preciso acreditar que vamos vencer!

Valha-nos Deus!

(ABRIL DE 2003)

Sem comentários:

Enviar um comentário